“Uivar à Lua”, o novo livro de Delfim Sardo

Uivar à Lua: Delfim Sardo lança livro de ensaios sobre artistas portugueses contemporâneos

O crítico e curador Delfim Sardo acaba de lançar Uivar à Lua — Escritos sobre Artistas, publicado pela Tinta da China. A obra reúne textos produzidos entre 2013 e 2025 e constitui uma das mais relevantes contribuições recentes para a reflexão sobre a arte contemporânea em Portugal. Mais do que um simples livro de crítica, esta publicação é um registo íntimo de cumplicidades, experiências e olhares partilhados com alguns dos mais importantes artistas nacionais.

Um testemunho essencial para a arte portuguesa

Com mais de uma década de ensaios, Uivar à Lua é um percurso intelectual e emocional que atravessa diferentes gerações e linguagens artísticas. Delfim Sardo, doutorado em Arte Contemporânea e atual administrador do Centro Cultural de Belém (CCB), oferece ao leitor um retrato abrangente da criação artística portuguesa recente, destacando figuras como Helena Almeida, Julião Sarmento, Aires Mateus, Alberto Carneiro, João Onofre, Sara Bichão e Gustavo Sumpta.

Organizado alfabeticamente, o livro permite uma leitura fluida e transversal, aproximando artistas de épocas e contextos distintos. Cada ensaio funciona como um fragmento de memória e pensamento, ao mesmo tempo pessoal e universal, no qual o autor procura compreender como a arte dialoga com o mundo, com a sociedade e com as emoções humanas.

O título e a metáfora do “uivo”

Logo na introdução, Delfim Sardo apresenta a frase que dá sentido ao título da obra: Escrever sobre arte é como uivar à Lua, porque é inútil e talvez mesmo fútil, mas há sempre a esperança de que algum eco responda. Esta metáfora sintetiza a fragilidade e, ao mesmo tempo, a beleza do ato crítico. Escrever sobre arte nunca substitui a experiência estética direta, mas pode criar ecos, abrir diálogos e lançar novas luzes sobre o trabalho dos artistas.

A imagem do “uivo à Lua” torna-se assim um símbolo da condição do crítico de arte: alguém que observa, interpreta e partilha, mesmo sabendo que a receção pode ser silenciosa ou imprevisível. Ao assumir esta posição, Sardo aproxima a crítica de uma prática poética, onde o essencial não é a resposta imediata, mas a possibilidade de eco no tempo.

Artistas em foco: múltiplas linguagens e gerações

Um dos grandes méritos do livro é a diversidade de artistas abordados. Entre os nomes encontramos figuras históricas da arte contemporânea portuguesa, como Helena Almeida, cuja obra explora a relação entre corpo, espaço e imagem, ou Julião Sarmento, reconhecido internacionalmente pela sua pesquisa sobre desejo, narrativa e identidade.

Estão também presentes arquitetos como Aires Mateus, referência incontornável na arquitetura contemporânea, bem como escultores de forte impacto simbólico, como Alberto Carneiro. Artistas mais recentes, como João Onofre, Sara Bichão e Gustavo Sumpta, ilustram a vitalidade e a multiplicidade de caminhos da nova geração criativa.

Ao reunir estas vozes num mesmo volume, Sardo não pretende criar um cânone fechado, mas sim abrir um mapa de relações, afinidades e tensões que caracterizam o panorama artístico português dos últimos anos.

Crítica, curadoria e cumplicidade

Mais do que simples análises formais, os textos revelam a proximidade profissional e intelectual do autor com os artistas. Delfim Sardo tem desempenhado um papel central na cena cultural portuguesa, quer como curador de exposições de referência, quer como responsável por instituições culturais. Esta experiência direta confere aos ensaios uma autenticidade rara, onde a crítica se mistura com o testemunho e a memória.

Ao invés de se posicionar como observador distante, Sardo escreve a partir da convivência com os processos criativos, explorando tanto os contextos históricos como as dimensões subjetivas da obra de arte. Esta abordagem torna Uivar à Lua não apenas um livro de crítica, mas um documento vivo sobre a história recente da arte portuguesa.

O papel da escrita sobre arte

Um dos temas centrais do livro é a reflexão sobre o próprio ato de escrever. Qual é a função da crítica no mundo atual? Até que ponto as palavras conseguem traduzir a experiência estética? Para Sardo, a escrita sobre arte não substitui a obra, mas cria um campo de ressonância, oferecendo pistas de leitura e abrindo portas à compreensão. É um espaço de mediação entre artista e público, onde se cruzam linguagem, pensamento e emoção.

Nesta perspetiva, Uivar à Lua reafirma a importância da crítica como prática cultural e intelectual. Num tempo marcado pela velocidade da informação e pelo consumo imediato de imagens, a escrita crítica é um convite à pausa, à reflexão e ao aprofundamento.

Delfim Sardo: figura central da cultura portuguesa

Além de autor e crítico, Delfim Sardo tem desempenhado funções de grande relevância no panorama cultural. Doutorado em Arte Contemporânea, foi diretor de várias instituições artísticas e desempenhou cargos de curadoria em museus, galerias e bienais. Atualmente, exerce funções de administrador no Centro Cultural de Belém, uma das instituições culturais mais importantes do país.

A sua trajetória confere ainda maior valor ao livro, pois cada ensaio é atravessado por décadas de experiência, de observação crítica e de envolvimento com os protagonistas da cena artística nacional e internacional.

Porque ler Uivar à Lua?

  • Reflexão aprofundada sobre a arte contemporânea em Portugal entre 2013 e 2025.
  • Visão única de um dos críticos e curadores mais respeitados do país.
  • Diversidade de artistas, de diferentes gerações e linguagens criativas.
  • Testemunho íntimo da relação entre crítica, curadoria e prática artística.
  • Escrita envolvente, que combina análise, memória e poesia.

Conclusão: um livro intemporal

Uivar à Lua — Escritos sobre Artistas não é apenas uma compilação de ensaios. É uma obra que documenta, interpreta e celebra a arte portuguesa das últimas décadas. Ao revisitar nomes fundamentais e ao refletir sobre o papel da crítica, Delfim Sardo oferece um contributo decisivo para a compreensão da criação contemporânea.

Trata-se de um livro essencial tanto para investigadores e estudantes de arte, como para o público interessado em conhecer melhor os artistas que moldaram — e continuam a moldar — o panorama cultural em Portugal. Mais do que nostalgia ou arquivo, é um convite à escuta, ao diálogo e ao reconhecimento da força transformadora da arte.

Com a sua metáfora do “uivo à Lua”, Delfim Sardo lembra-nos que falar de arte é um ato de esperança: esperança de que as palavras encontrem eco, de que as obras inspirem gerações futuras e de que a cultura permaneça viva como espaço de partilha, identidade e imaginação.

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uivar-a-lua-o-novo-livro-de-delfim-sardoEm Uivar à Lua — Escritos sobre artistas (Tinta da China), Delfim Sardo reúne ensaios produzidos ao longo de mais de uma década, dedicados a artistas com quem trabalhou ou cuja obra acompanhou de perto. A escolha do título é reveladora: escrever sobre arte, para Sardo, é um gesto simultaneamente necessário e fútil, como “uivar à Lua”, com a esperança de que algum eco responda.O livro organiza-se alfabeticamente, opção que garante clareza mas que também fragmenta a leitura. Essa estrutura, porém, permite percorrer livremente diferentes gerações e linguagens da arte contemporânea portuguesa, desde Helena Almeida e Julião Sarmento a Sara Bichão ou Gustavo Sumpta.O que distingue esta coletânea é o tom íntimo. Sardo não escreve como crítico distante, mas como cúmplice. Os textos nascem de experiências partilhadas, de processos criativos acompanhados e de conversas prolongadas. A dimensão curatorial atravessa o livro: cada ensaio é também um olhar sobre como a arte se mostra, se apresenta e se oferece ao público.Há momentos de grande intensidade — quando o autor descreve a fisicalidade de uma obra ou a presença quase corporal da ausência — e outros em que a prosa se aproxima do diário pessoal, marcada por memórias e afetos. Essa oscilação é, ao mesmo tempo, a força e a limitação do volume: por vezes falta-lhe um fio condutor mais sistemático, mas ganha-se em autenticidade e densidade emocional.Uivar à Lua é, no fundo, um testemunho de convivência com a arte e com os artistas. Mais do que um manual de crítica, é um exercício de escuta, de atenção e de partilha. Um livro que confirma Delfim Sardo como uma das vozes mais relevantes do pensamento artístico em Portugal, capaz de transformar o ato de escrever sobre arte num gesto poético, frágil e necessário.